9 de jul. de 2011

Geometria do amor | poesia de Leonardo Almeida publicada na edição nº 1

Ah, se o amor não fosse esse mistério
a eterna sensação de estar perdido
o espaço do sossego consumido
na chama do mais puro desidério.


Quem dera que amar fosse preciso
um certo experimento controlado
um dado com o seis em cada lado
um jogo sem perdedores ou riscos


Eu sei que o amor não tem carta marcada
Por isso é tão gostoso de jogar
E perceber que em cada mão jogada


Existe um jeito novo de ganhar
O amor é a geometria inexata
Amar é quando a linha é não linear

Dentada de Satã | poesia de Donne Pitalurgh publicada na edição nº 1

Ouvia cantar o galo
Quase às três da manhã
O galo cantava louco
Só minha certeza era sã
De trazer galos na boca
De ser uma cachorra louca
Gemendo para satã


Mas o galo que cantava
Pouco sabia de mim
Não via que eu era cego
Nem de minh'alma o cetim
Dizia que eu marcava touca
Berrava com sua voz rouca
Prenunciando o meu fim


Do galo cortei a espora
Que roçava na manhã
Pouco importando se o dia
Sofria de febre terçã
É que a visão tão pouca
Me deixou gosto na boca
Das dentadas de satã.

As novidades do FAC 2011 | publicadas na edição nº 1

No dia 25 de maio, o Conselho de Cultura aprovou uma Resolução com alterações para o FAC 2011. Quem tiver intenção de participar, já pode ir preparando o projeto. Por falta de espaço, informamos aqui apenas a que pode ser a principal alteração, pois ela visa diversificar a aplicação dos recursos, e induzir os proponentes a conceberem projetos para a população mais desassistida por outras políticas públicas. Para isso, o proponente deverá responder um questionário com as seguintes perguntas: As novidades do FAC 2011

a) valor dos recursos recebidos do FAC nos dois anos anteriores ao da proposta;
b) número de projetos que já realizou apoioado pelo FAC desde 1999;
Obs.: quanto menor for o valor e o número de projetos, maior será a sua pontuação.
c) cidade da Produção do Projeto;
d) cidade da Execução do Projeto;
Obs.: As cidades da produção e da execução do projeto interferem na pontuação. Ver na planilha da SEDEST/DF ou Portaria Conjunta nº 01/2009 das Secretarias de Estado de Cultura e de Segurança Pública.
e) valor previsto na Divulgação do Projeto;
f) valor previsto para Gestão e Administração;
Obs.: Quanto maior o valor para a divulgação, gestão e administração, mais pontos o projeto terá, desde que respeite cada limite previsto no questionário. 
g) preço ao destinatário do produto ou evento cultural.
Obs. Preços mais acessíveis elevam a pontuação e a gratuidade atinge a máxima.

A história do FAC | texto de Carlos Augusto Cacá publicado resumidamente em duas partes nas edições nº 0 e nº 1

Para compreensão da criação do fundo de cultura do DF, sua relação com o movimento cultural da época, suas mudanças desde o surgimento, vamos primeiro contextualizar a situação política e o período histórico.
O primeiro texto abaixo conta a história do movimento cultural das satélites da década de 80, quando foram criadas as divisões  de cultura nas Administrações Regionais e o Conselho de Cultura do DF. Os avanços políticos conquistados nesse período incluíam a criação, pela Lei nº 158/1991, do primeiro fundo para a cultura do DF, o Fundo de Apoio à Arte e à Cultura – FAAC, que em 1999 foi substituído pelo Fundo de Arte e Cultura – FAC.
O segundo texto é relativo à legislação aplicada ao FAC, que começa em 1999 com a criação do Programa de Apoio à Cultura – PAC e do FAC como um dos mecanismos desse programa. Somente a partir daí, o fundo realmente passou a apoiar os projetos da comunidade, já que o primeiro fundo criado não teve nenhuma conseqüência real porque o governo não destinou os recursos previstos.
Boa leitura e discussão em seu grupo de produtores culturais!



A periferia na história da cultura do DF - O movimento cultural das satélites e as primeiras conquistas

A Secretaria de Cultura é responsável pela política pública de todo o DF, mas sua estrutura de elaboração e execução só existe no Plano Piloto. A falta de capilaridade da Secretaria deixou as cidades satélites esquecidas por duas décadas. Mas o ânimo político do fim da ditadura impulsionou o movimento cultural das satélites, que diagnosticou o abandono de suas cidades pelos governos elitistas e iniciou ações conjuntas de todas as áreas culturais. A 1ª FACULTA, em 1982, e a 1ª Semana de Arte e Cultura de Taguatinga, em março de 1983, deram impulso à articulação com outras cidades e à criação de associações culturais em Taguatinga e Ceilândia. Essa efervescência contribuiu também para a rearticulação da Federação de Teatro Amador do DF (FETADIF) em 1984. A FETADIF teve grande importância por possibilitar a participação de representantes de grupos de diversas cidades do DF em seminários e festivais nacionais. Isso enriquecia a visão estética e política dos militantes culturais dessas cidades, tanto que logo tomou força no movimento a crítica ao apadrinhamento de artistas e à produção cultural realizada pelo governo.
Com esse cenário político, a elite iniciou um período de práticas populistas. O governo do DF continuou sendo biônico, mas tinha que ter perfil distinto dos da ditadura. Assim, foi nomeado José Aparecido para o GDF e Pompeu de Sousa para a Secretaria de Educação e Cultura (era uma só para as duas áreas). Surgiu então o diálogo com o movimento cultural e, nesse período, os militantes das diversas satélites passaram a agir de forma articulada para confrontar com as políticas centristas. Defendia a publicação de editais para que todos os artistas pudessem concorrer aos recursos públicos e a participação de representantes da comunidade nas comissões de seleção. Por isso, a partir de 85 ou 86, ocorreram os primeiros editais do DF justamente na área de artes cênicas e os representantes dos grupos amadores e profissionais participaram da comissão de seleção.



As satélites elegeram o primeiro representante comunitário no Conselho da FCDF


Ainda no governo Aparecido, foi criada a Secretaria de Cultura e a secretária Vera Pinheiro, para legitimar-se, prometeu destinar metade dos cargos do Conselho Deliberativo da Fundação Cultural aos representantes eleitos pelo movimento cultural. Em 1986 foi criado o Movimento de Articulação Cultural (MAC), do qual participavam quase todas as entidades culturais do DF. Foi o MAC que realizou a eleição dos representantes da comunidade para o Conselho da Fundação. O resultado foi legitimado por todos, inclusive pelos candidatos que não conseguiram sua indicação entre os cinco nomes a serem enviados à secretária (três para serem conselheiros efetivos e dois para serem suplentes).
O movimento das satélites fez uma boa articulação com outras entidades culturais (Sindicato dos Escritores, Federação de Teatro Amador, Associação dos Produtores Culturais) e, com elas, conseguiu eleger a maioria dos cinco nomes, inclusive o mais votado. Não era o que a secretária esperava e ela não honrou o compromisso. Nomeou apenas o mais votado pelo movimento e preencheu as outras quatro vagas com pessoas de sua escolha, incluindo até um nome que havia se candidatado pelo movimento e não conseguiu ficar entre os cinco eleitos.
Diante do retrocesso, o MAC voltou a se reunir para avaliar se devia aceitar a vaga. Houve polêmica. Uma boa parte do movimento defendeu a não participação naquelas condições, mas por maioria decidiu participar de forma crítica, destacando que o representante do movimento tem papel distinto dos demais conselheiros que foram nomeados por vontade do governo e que, por isso, sua vinculação política será com o movimento e não com o governo. Isso foi destacado no discurso de posse e na segunda reunião do Conselho e foi criticado por um dos representantes do governo que queria apagar a distinção de origem dos conselheiros e considerar que todos estavam ali porque foram nomeados pelo governador. Além disso, defendeu que os assuntos do conselho não poderiam ser levados à discussão no movimento cultual. O representante do movimento esclareceu que só podia subordinar-se politicamente ao movimento que o elegeu.
Enfim, o movimento não foi plenamente vitorioso, mas mostrou muito mais força que se esperava e desmascarou o discurso populista do governo. A partir daí, passou a contar com um representante independente, que prestava contas de suas posições e construía no movimento as propostas que iria defender, como se vê em uma convocatória do MAC publicada no Jornal de Brasília e no Correio Braziliense de 06 de janeiro de 1987. Por deliberação da mesma assembleia que elegeu os representantes da comunidade, o MAC passou a contar também com uma percentual do jeton do conselheiro para a edição de um jornal e outras tarefas. As críticas do movimento ao governo passaram a ter mais repercussão, porém os grupos que defendiam a recusa do cargo se afastaram do movimento, criando um desgaste político.


As divisões do movimento e o surgimento das DRCs


Pouco tempo depois do fim do mandato do primeiro representante da comunidade no Conselho da Fundação cultural, o governo nomeou o mesmo representante para mais um mandato. Ele levou o assunto para discussão no movimento e informou que a nova nomeação foi feita sem nenhuma consulta a ele e que foram nomeados também outros militantes que haviam se afastado do MAC. O movimento entendeu que a eleição de anos atrás não legitimava as novas nomeações e que a comunidade só poderia ser representada se pudesse encaminhar novas eleições. Em respeito a essa decisão, o primeiro representante do movimento no conselho recusou o segundo mandato e entregou uma carta à FCDF criticando as nomeações à revelia do movimento. A carta foi entregue no dia da posse dos novos conselheiros, mas, somente o ex-representeante do MAC, oriundo do movimento das satélites, recusou o cargo. À revelia do movimento, tomaram posse outros nomeados, inclusive alguns antigos militantes do MAC.
Além disso, outras mudanças enfraqueceram o movimento das satélites, tais como o afastamento de algumas lideranças importantes e a retirada do apoio que a Fundação Cultural dava para suas reuniões. Em 1990, Márcio Cotrim assumiu a secretaria de cultura e passou a convidar representantes do movimento das satélites para ocuparem cargos culturais nas administrações de suas cidades. O movimento ficou dividido mais uma vez. Algumas cidades discutiram o assunto e aprovaram a indicação de nome da comunidade para o cargo. Nesses casos, devemos entender como processo legítimo. Outros representantes aceitaram os cargos sem colocar o assunto em discussão e passaram a defender as políticas do secretário e a ser tratados com desconfiança pelo movimento. Outras pessoas que assumiram esses cargos não tinham participado do período vigoroso do movimento das satélites e assimilaram sem qualquer crítica as orientações da secretaria. Assim surgiram os cargos que deram origem às divisões regionais de cultura – DRCs, vinculados à estrutura da administração regional. Cumpriram o papel de terminar de dividir o movimento e enfraquecer as críticas.


As derrotas da comunidade também impulsionaram conquistas da comunidade


O governo conseguiu enfraquecer o movimento, mas nem por isso impediu que as políticas avançassem no rumo que queríamos. Tanto a cooptação de militantes para o conselho da Fundação Cultural quanto para as DRCs representam concessões que o governo teve que fazer para nos enfraquecer. E se, por um lado, realmente nos enfraqueceram, por outro, comprometeram a credibilidade militantes que assumiram cargos sem a legitimidade das discussões na comunidade. Para tentarem se reabilitar, eles tiveram que defender lá dentro do governo algumas propostas que defendíamos nas ruas e que os representantes eleitos pela comunidade levavam para os Conselhos e Fóruns do governo. Isso ajudou na conquista da paridade no Conselho da Fundação Cultural. Posteriormente, em junho de 1990, o então governador Wanderley Vallim criou no Conselho de Cultura também paritário. Curiosidades: 1 – participou desse primeiro conselho como representante do governo o ex-senador Luís Estevão; 2 – foi esse primeiro conselho de cultura que, por iniciativa de um representante da comunidade oriundo de Ceilândia, defendeu até conseguir a aprovação do primeiro fundo de arte e cultura do DF. Em 1999, esse fundo foi extinto e, em seu lugar, foi criado o FAC.
E, em política é assim: quem é assimilado pelo poder sempre pensa que foram eles os responsáveis pelos avanços porque foram eles que redigiram em conjunto com o poder os termos da lei. Nós que não cedemos e fomos derrotados sabemos que os avanços poderiam ser maiores se estivéssemos todos unidos no enfrentamento, mas sabemos também que todo o avanço que ocorreu foi resultado justamente do enfrentamento que se deu antes da conciliação e que levou o poder a ceder parte das reivindicações para nos enfraquecer.


Nota:

Não confundamos poder com governo. Há governos que não têm poder, como foi o caso do Rosso e o poder não controla totalmente todos os governos. O poder de fato está na classe dominante, que, em regra, controla a maior parte do Estado. Há exceções aqui ou acolá, porque os dominados também lutam e muitas vezes assumem espaços no governo aqui e acolá. Sejamos críticos e vigilantes para que estes não se afastem de nós.

A legislação do FAC

Depois de 10 anos de criação do primeiro fundo, surgiu o FAC

O primeiro fundo de apoio à cultura do DF havia sido criado com a primeira lei de incentivos, a Lei nº 158 de 1991. Entretanto, ela não foi implantada nem pelo governo que a criou (Roriz-Wanderley Vallim) nem pelo seu sucessor (Cristovam). Somente quanto Roriz sucedeu Cristovam é que foi editada uma nova lei criando o FAC que realmente passou a apoiar projetos culturais da comunidade. Essa é a Lei Complementar nº 267, de 15 de dezembro de 1999, que criou o Programa de Apoio à Cultura – PAC. O FAC é apenas uma parte desse programa, um dos seus mecanismos de execução. Mas na prática é o único mecanismo que interfere na vida cultural do DF.
A Lei Complementar nº 267/99, no seu art. 1º, apresenta como finalidade do FAC captar recursos para atender quatro objetivos: proporcionar a todos os cidadãos os meios para o livre acesso às fontes de arte e cultura e o pleno exercício dos direitos artísticos e culturais; preservar, apoiar, valorizar e difundir o conjunto das manifestações culturais do DF e seus respectivos criadores; preservar bens materiais e imateriais do Patrimônio Histórico e Artístico do DF; priorizar o produto artístico e cultural do DF.
Além do FAC, o Programa tem mais dois mecanismos previstos em seu art. 2º: Incentivo a projetos artísticos e culturais; e Dotações orçamentárias do Distrito Federal.
Este texto tratará apenas do FAC, mas antes vamos falar das finalidades do Programa, uma vez que elas se aplicam também ao FAC. O art. 3º estabelece como finalidades do PAC captar e canalizar recursos para projetos artísticos e culturais que tenham, pelo menos, um dos seguintes objetivos: incentivo à formação artística e cultural; fomento à produção artística e cultural; preservação e restauração do patrimônio artístico, cultural e histórico; pesquisa e difusão dos bens e valores artísticos e culturais; e outros objetivos que o Conselho de Cultura e a Secretaria de Cultura consideram relevantes.
O art. 4º enumera os segmentos culturais apoiados pelo PAC, contemplando todas as atividades artísticas e também o folclore; o artesanato; o patrimônio cultural, histórico, arquitetônico e arqueológico; as bibliotecas; os museus; os arquivos e demais acervos; o rádio e a televisão educativos e culturais, sem caráter comercial. Estabelece também que o PAC é destinado apenas a projetos que proponham a exibição, utilização e circulação pública dos bens artísticos e culturais, não permitindo apoio a obras, produtos, eventos ou outros projetos, destinados a circuitos ou coleções particulares. Os recursos do Programa são acessíveis a projetos de pessoas físicas e pessoa jurídica de direito privado.
O art. 4º estabelece que o recebimento de novos incentivos pelo beneficiário fica condicionado à execução e à apresentação da prestação de contas de projetos anteriores. Nota-se aqui, a presença do princípio da moralidade, pois seria incorreto apoiar outro projeto de um produtor que tivesse recebido recursos para um projeto anterior e não cumprisse integralmente seu contrato. A Secretaria de Cultura, entretanto, tem aplicado de forma equivocada essa restrição, estendendo-a a beneficiários que ainda não tiveram suas contas aprovadas, mesmo nos casos em que eles já cumpriram sua obrigação, realizando o projeto e prestando contas.  Isso fere o princípio da legalidade, pois a lei só impede a participação daqueles que ainda não prestaram contas.
Agora, tratando especificamente do FAC, o art. 5º da Complementar nº 267 trata-o como um mecanismo, administrado pela Secretaria de Cultura, que visa captar e destinar recursos para projetos do PAC. É um Fundo de natureza contábil com prazo de duração indeterminado. Financia projetos artísticos e culturais sob a forma de apoio a fundo perdido ou empréstimos reembolsáveis conforme regulamento.
Conforme art. 6º, os recursos do FAC podem ter as seguintes origens: dotações orçamentárias do Distrito Federal; contribuições e subvenções de instituições financeiras; contribuições compulsórias das empresas beneficiárias com incentivos fiscais concedidos pelo Distrito Federal; convênios com organismos nacionais e internacionais; recursos de loterias; recursos de multas aplicadas a pessoas físicas ou jurídicas que utilizarem indevidamente os recursos do FAC; valores recebidos a título de juros e demais operações financeiras decorrentes da aplicação de recursos do próprio Fundo; doações de pessoas físicas ou jurídicas; vendas de produtos artísticos e culturais que resultem de projetos apoiados por esta Lei Complementar; saldo de exercícios anteriores; outros recursos, exceto de natureza tributária.
Ainda nos parágrafos do art. 6º, ficou estabelecido que, se por ventura as contribuições compulsórias das empresas beneficiárias com incentivos fiscais concedidos pelo Distrito Federal não alcançarem o montante de dois milhões e cinqüenta mil UFIRs¹, o Governo do Distrito Federal deverá arcar com a diferença apurada e também que, para terem acesso aos recursos do FAC, os interessados, devem ter projetos aprovados previamente pela Secretaria de Cultura, através do Conselho de Cultura, de acordo com os critérios estabelecidos em regulamento.
Note-se que aqui também começam a aparecer dois princípios da Administração, pois os “critérios estabelecidos em regulamento” indicam que haverá um regulamento a ser publicado (publicidade) e esse regulamento conterá critérios de seleção, o que contribui para a impessoalidade.
Outra observação importante é que a aprovação do projetos através do Conselho de Cultura pressupõe a participação comunitária nas decisões, uma vez que esse conselho conta com 50% de membros indicados pela comunidade num sistema de lista tríplice.
No art. 7º, a lei estabelece que podem apresentar projetos ao Fundo apenas as entidades ou pessoas físicas envolvidas com a arte e a cultura, estabelecidas ou residentes no Distrito Federal há mais de dois anos. Isso se dá em observância ao pacto federativo, segundo o qual cada ente federado deve ter autonomia para estabelecer suas políticas públicas. Assim, não caberia ao Distrito Federal destinar recursos às atividades culturais de moradores de outros estados.
Conforme art. 8º, a Secretaria de Cultura do DF administra os recursos do FAC, através do Conselho de Administração, que é composto por seis membros nomeados pelo Governador, tendo como presidente o Secretário de Cultura.
O parágrafo terceiro do art. 8º da Lei Complementar nº 267/99 tem o importante papel de impedir que entidades governamentais tenham acesso aos recursos do Fundo da Arte e da Cultura, pois não seria razoável colocar a comunidade cultural e os órgãos do Estado disputando os recursos nas mesmas fontes públicas. Certamente que há aí uma desigualdade de condições de concorrência.
Destacamos ainda os três dispositivos que estabelecem restrições cujo objetivo é assegurar o atendimento ao princípio da moralidade. A primeira delas está no § 4º do art. 8º, em que se proíbe os membros ou suplentes do Conselho apresentarem projetos próprios ou participarem de projetos incentivados pelo Fundo na qualidade de beneficiário ou empreendedor. Da mesma forma, fica impedida a entidade que tenha como participante um membro ou suplente do Conselho.  A segunda, contida no art. 9º, é previsão de multa e outras penalidades aos que fizeram uso indevido dos recursos advindos de incentivos. E a terceira, parágrafo único do art. 9º, é o impedimento de os artistas apenados utilizarem, durante cinco anos, os incentivos previstos nesta Lei Complementar.
A Lei Complementar nº 267/99 sofreu as seguintes modificações:


a) a Lei Complementar nº 389/2001 inseriu a arrecadação de bilheteria, cessão de espaços e outras atividades da Secretaria de Estado da Cultura como mais uma fonte de recursos do FAC;b)  Lei Complementar nº 695/2004 passou a destinar um máximo de 3,5% dos recursos consignados no Orçamento Anual do Fundo para aquisição ou locação de equipamentos e suprimentos necessários ao cumprimento das suas finalidades, e vedou a Secretaria de Cultura a utilizar recursos do Fundo para suas despesas de manutenção administrativa;c) a Lei Complementar nº 782/2008 mudou o nome para Fundo de Apoio à Cultura e vedou a destinação de mais de um terço dos recursos anuais do FAC a uma mesma Região Administrativa (§ 5º, art. 4º).
           
Como se vê, a Lei Complementar nº 267/99, que criou o PAC e o FAC, e as alterações posteriores, estabelecem um mecanismo de apoio à cultura plenamente integrado aos dispositivos constitucionais. Destacamos que o parágrafo sexto do art. 216 da CF prevê a destinação de até 0,5% dos tributos para fundos culturais e o parágrafo primeiro prevê a colaboração entre o Estado e a comunidade para promover e proteger “o patrimônio cultural brasileiro”. Tudo isso fica mais estruturado quando acrescentamos o caput do art. 215, que obriga o Estado a garantir “a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais”.
O FAC tem um regulamento legal bastante coerente com esses dispositivos constitucionais, especialmente pelos seguintes motivos: conta com 0,3% da RCL; tem a participação da comunidade no processo de seleção de projetos; e tem como objetivos proporcionar a todos os cidadãos os meios para o livre acesso às fontes de arte e cultura e o pleno exercício dos direitos artísticos e culturais; preservar, apoiar, valorizar e difundir o conjunto das manifestações culturais do DF e seus respectivos criadores; preservar bens materiais e imateriais do Patrimônio Histórico e Artístico do DF; priorizar o produto artístico e cultural do DF. Assim, no âmbito legal, vemos que a legislação do FAC é bastante ajustada à Constituição Federal.


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¹ Unidade Fiscal de Referência: índice usado como indexador monetário.

Taguatinga, memória e identidade | poesia de Chico Simões e Chico de Assis publicada na edição nº 1

Memória em mim é um rio
História desse lugar
Mata virgem, barro branco
Gente que vinha pescar
Escorregar no barranco
Tomar seu banho e brincar.

Igual às muitas cidades
Aldeia já fui também
Tawá Tingá foi meu nome
Batismo que quero bem
E conto aqui minha história
De fatos que a vida tem.

Há mais de cinquenta anos
Plantaram um sonho verdade
No altiplano central
Uma bonita cidade
Se fez de um Plano Piloto
Brasília realidade.

Acontece que nem toda
Gente por lá se valia
Foi crescendo sem parar
A enorme periferia
Abrigando todo mundo
Que no Plano não cabia.

Foi Taguatinga ocupada
Por candangos pioneiros
Que da noite para o dia
Dos últimos foram os primeiros
Lutando por seus direitos
Como valentes guerreiros.

E aqui um pé de guerra
Formou-se com grande ardor
Governo mandou polícia
Para expulsar morador
Mas não se vence quem luta
Por direito com fervor.


E dando a volta por cima
Taguatinga foi em frente
Através de muita luta
De um povo forte e valente
Qu'aos poucos a transformou
Numa cidade decente.

Sua miscigenação
Com pessoas do nordeste,
Do centro oeste, do norte,
Do sul, também do sudeste
Deu o seu tom de cidade
Elegante e inconteste.

Caminhões de pau de arara
Chegavam a todo instante
Trazendo novos candangos
Para acordar o gigante
Brasil que estava dormindo
Mas acordou nesse instante.

Artistas aqui te cantam
Repentistas, forrozeiros,
Cantores, atores, mímicos,
Circenses, mamulengueiros,
Escritores e outros mais:
Novatos e pioneiros.

Esse balaio de gente
Em Taguatinga é normal
Que faz em gêneros e raças
Miscelânia cultural
A cidade mais gostosa
Do distrito federal.

Com festa vamos louvar
Essa memória de luta
Mas a luta é pela paz
De uma cidade batuta
A capital do planalto
Taguatinga absoluta.

Festa Junina | poesia de Daniel Rosado publicada na edição nº 1, junho/2011

O povo desse Brasil
Vive caçando desculpa
Pra enforcar o trabalho
Sem precisar sentir culpa.
Porque é povo festeiro.
E festa de brasileiro
Até a Igreja ajuda.

O melhor dos feriados
É quando é festa pra santo.
O padre chama o prefeito.
Eles cochicham num canto.
Fica tudo arranjado.
Quando chega o feriado,
Aí eu almoço e janto.

É assim no mês de junho.
Tem festa pra todo lado.
Na escola, na igreja,
No clube do povoado,
Na casa do coronel,
O povo tira o chapéu
Quando o santo é festejado.


No dia de Santo Antônio,
Uns rezam pra se casar.
No dia de São João,
O noivo quer se mandar.
E no dia de São Pedro,
Quem pecou fica com medo.
Vai pra procissão rezar.

Mas, quando termina a missa,
O povo todo festeja.
O padre faz um leilão
Pra construir outra igreja.
O trio toca um forró.
E quem não quer ficar só
Tanto dança quanto beija.

O povo dança a quadrilha,
Se atrapalha e acha graça.
As meninas mais mimosas
Saem pra passear na praça,
Procurando homens bonitos.
Os seus pais ficam aflitos.
Até a festa perde a graça.

Mas, nessas festas juninas,
quando se acende a fogueira,
Nossa alma se ilumina
Enfeitada de bandeira.
E a gente sonha com o povo
Construindo um mundo novo
Pra ter festa a vida inteira.

O Teatro nas ruas e Taguatinga no palco | crônica do poeta medieval japonês Mayzum Kitema publicada na edição nº 1, Jun/2011.

Neste 5 de junho de 2011, Taguatinga completou 53 anos. Nossa homenagem foi a publicação desta crônica narrando a turnê do Grupo Retalhos nas favelas da cidade. Além de se apresentar, o grupo pesquisava o cotidiano dos moradores para preparar um novo espetáculo que teria Taguatinga como tema. Nem tudo narrado aqui é verdade, mas vejam no que deu essa empreitada.

Foto: Manuel Pimentel 

Chegamos à Boca da Mata por volta de oito horas de um sábado e, às nove, com todos os atores caracterizados, o grupo saiu pelos becos da vila cantando, dançando, brincando com as crianças e  distribuindo panfletos de porta em porta.

Brasília de Carla de Andrade - publicada na edição nº 0

*Pela passagem do aniversário de Brasília no mês de abril, publicamos essa poesia de Carla Andrade.


O tempo e suas longas tranças
debruçadas em varandas com
vista para os olhos da cidade.

A cidade com seus sentimentos
enclausurados em caixas de concreto,
pés de aço,
jardins de cimento,
estátuas mijadas.

Você tem que ser híbrido,
até seu silêncio deve ser civilizado.
Deixe o que é visceral para
a fotosíntese das plantas.

O que é magistral na sua loucura
para a metamorfose das borboletas.

Nada de mudanças repentinas,
enquanto a cidade e seu relógio analógico
decidem seu destino.
Ande devagar, não olhe para os pássaros.

Quando você assumir uma cor cinzenta
e tiver a idade do ralo, do bueiro,
a cidade respirará
o resto de sua alma.
Vão te chamar de homem,
seus músculos tensos
serão condecorados,
até que você não tenha nem
mais o consolo da beleza
do abismo da tristeza.

Você ficará só com seus olhos de boneca
sentindo em suas feridas o focinho da cidade.
O tempo irá desfazer nossas tranças.

Banana com farinha de Máximo Mansur - publicada na edição nº 0

Me disseram que isso é bom
de comer e de beber.
Porque Fulano e Sicrano
come isso e bebe isso.
Me disseram que isso é bom
de cheirar e de fumar.
Porque Fulano e Sicrano
cheira isso e fuma isso.

Aí me vem essa vontade danada
de comer banana.
Aí me vem essa vontade danada
de chupar abacaxi.

Não quero comer escargot pra parecer.
Não quero comer sashimi pra parecer.
Não quero comer caviar pra parecer.
Só quero comer se eu gostar do “di comê”.

Eu já fiz tudo que eu devia fazer.
Eu já fiz tudo que eles diziam.
Eu já fiz tudo que eu devia fazer.
Eu já fiz tudo que eles diziam
que eu devia fazer.

Aí me vem essa vontade danada
de comer banana.
Comer banana com farinha.
Aí me vem essa vontade danada
de comer abacate.
Abacate com farinha.
Aí me vem essa vontade danada
de tomar café.
Com farinha
Aí me vem essa vontade danada
de comer o “di comê”.

História do FAC a partir das bases políticas da década de 80 - publicado na edição nº 0

Para compreensão política do fundo de cultura do DF é preciso conhecer sua relação com o movimento cultural, contextualizar o período histórico em que surgiram as ideias consolidadas no fundo. Por meio da história e das mudanças políticas de âmbito nacional daquela época, vemos como cresceram as bases filosóficas e políticas da criação do FAC: um fundo para democratizar o acesso aos recursos públicos, em que a comunidade participa das deliberações do Estado. O texto a seguir foi escrito por Carlos Augusto Cacá para mostrar a influência do movimento cultural das satélites da década de 80 na criação das divisões de cultura nas Administrações Regionais e do Conselho de Cultura do DF. Os avanços políticos desse período incluíam a criação do primeiro fundo para a cultura do DF, pela Lei nº 158/1991, o Fundo de Apoio à Arte e à Cultura - FAAC, que em 1999 foi substituído pelo Fundo de Arte e Cultura – FAC. Por falta de espaço, publicamos agora apenas dois dos quatro tópicos dessa história. Continuaremos no próximo número da revista. Mas quem quiser ver logo o texto completo, vá ao www.culturanaveia.com.br

As primeiras conquistas do movimento

A Secretaria de Cultura é responsável pela política pública de todo o DF, mas sua estrutura de elaboração e execução só existe no Plano Piloto. A falta de capilaridade da Secretaria deixou as cidades satélites esquecidas por duas décadas. Mas o ânimo político do fim da ditadura impulsionou o movimento cultural das satélites, que diagnosticou o abandono de suas cidades pelos governos elitistas e iniciou ações conjuntas de todas as áreas culturais. A 1ª FACULTA, em 1982, e a 1ª Semana de Arte e Cultura de Taguatinga, em março de 1983, deram impulso à articulação com outras cidades e à criação de associações culturais em Taguatinga e Ceilândia. Essa agitação contribuiu também para a rearticulação da Federação de Teatro Amador do DF (FETADIF) em 1984. A FETADIF foi importante por possibilitar a participação de representantes de grupos de diversas cidades do DF em seminários e festivais nacionais. Isso enriquecia a visão estética e política dos militantes culturais dessas cidades, tanto que logo tomou força no movimento a crítica ao apadrinhamento de artistas e à produção cultural realizada pelo governo. O cenário nacional era: fim da ditadura militar; legalização de partidos proibidos; volta de exilados políticos, campanha por eleições diretas pra Presidente; criação do PT e da CUT; derrubada de pelegos em grandes sindicatos. Mais  relacionado ao âmbito cultural, aconteceram a reconstrução da UNE e o crescimento do movimento cineclubista, da Confederação Nacional de Teatro Amador, da Associação Brasileira de Teatro de Bonecos e outros. No DF, havia também a luta pela emancipação política: somente a partir de 1986, o DF pode votar para senador e deputado federal, e somente depois da Constituição de 1988, foram instituídas aqui as eleições para governador e deputado distrital. Foi nesse cenário que a elite iniciou as práticas populistas no DF. O governo, mesmo sendo biônico, tinha que ter perfil distinto dos da ditadura. Assim, foi nomeado José Aparecido para o GDF e Pompeu de Sousa para a Secretaria de Educação e Cultura (era uma só para as duas áreas). Surgiu então o diálogo com o movimento cultural e, nesse período, os militantes das diversas  atélites passaram a agir de forma articulada para confrontar com as políticas centristas. Defendia a publicação de editais para que todos pudessem concorrer aos recursos e a participação de representantes da comunidade nas comissões de seleção. Por isso, a partir de 86, ocorreram os primeiros editais do DF justamente na área de artes cênicas e a FETADIF e o sindicato dos profissionais de teatro e dança participaram da comissão de seleção.

As satélites elegeram o primeiro representante comunitário no Conselho da FCDF

Ainda no governo Aparecido, foi criada a Secretaria de Cultura e a secretária Vera Pinheiro, para legitimar-se, prometeu destinar metade dos cargos do Conselho Deliberativo da Fundação Cultural aos representantes eleitos pelo movimento cultural. Em 1986 foi criado o Movimento de Articulação Cultural (MAC), do qual participavam quase todas as entidades culturais do DF. Foi o MAC que realizou a eleição dos representantes da comunidade para o Conselho da Fundação. O resultado foi legitimado por todos, inclusive pelos candidatos que não conseguiram sua indicação entre os cinco nomes a serem enviados à secretária (três para serem conselheiros efetivos e dois para serem suplentes). O movimento das satélites fez uma boa articulação com outras entidades culturais (Federação de Teatro Amador, Sindicato dos Escritores, Associação dos Produtores de Artes Cênicas, Associação de Teatro de Bonecos) e, com elas, conseguiu eleger a maioria dos cinco nomes. O mais votado era de Taguatinga. Não era o que a secretária esperava e ela não honrou o compromisso. Nomeou apenas o mais votado e preencheu as outras quatro vagas com pessoas de sua escolha, incluindo até um nome que havia se candidatado pelo movimento e não conseguiu ficar entre os cinco eleitos. Diante do retrocesso, o MAC voltou a se reunir para avaliar se devia aceitar a vaga. Houve polêmica. Uma boa parte do movimento defendeu a não participação naquelas condições, mas por maioria apertada decidiu participar de forma crítica, destacando que o representante do movimento tem papel distinto dos demais conselheiros que foram nomeados por vontade do governo e que, por isso, sua vinculação política será com o movimento e não com o governo. Isso foi destacado no discurso de posse e na segunda reunião do Conselho e foi criticado por um dos representantes do governo que queria apagar a distinção de origem dos conselheiros e considerar que todos estavam ali para defender a cultura da cidade. Além disso, defendeu que os assuntos do conselho não poderiam ser levados à discussão no movimento cultual. O representante do movimento esclareceu que só podia subordinar-se politicamente ao movimento que o elegeu. Enfim, o movimento não foi plenamente vitorioso, mas mostrou-se independente e desmascarou o discurso populista do governo. O movimento passou a contar com um representante, que prestava contas de suas posições e construía na comunidade algumas das propostas que iria defender, como se vê em uma convocatória do MAC publicada no Jornal de Brasília e no Correio Braziliense de 06 de janeiro de 1987. Por deliberação da assembleia que elegeu os representantes da comunidade, o MAC passou a contar também com uma percentual do jeton do conselheiro para a edição de um jornal e outras tarefas. As críticas do movimento ao governo passaram a ser divulgadas em jornal editado com esses recursos. Mas os grupos que defendiam a recusa do cargo se afastaram e isso enfraqueceu o movimento. 

As pré-conferências de Cultura do DF - publicado na edição nº 0

Foram dois meses de debates em pré-conferências de cultura convocadas pelo governo. Isso é positivo. Melhor que isso seria se a própria comunidade estivesse realizando. Chegaremos lá. Com todas as falhas que vimos, ainda achamos que os debates ajudam mais que atrapalham na preparação da comunidade cultural para compreenderem seu papel. O maior absurdo foi alguém ter levado um ônibus de moradores de São Sebastião para participarem da pré-conferência do Cruzeiro, votando e disputando propostas com os moradores desse bairro. São Sebastião já tinha realizado a maior pré-conferência e eleito a maior delegação de todas as cidades. Mas alguns vigaristas da cidade (e todas têm os seus) ainda queriam mais. Se aproveitaram de uma falha da organização (não exigir comprovante de residência) e trouxeram um ônibus de conferencistas de longe. Os moradores locais, indignados, filmaram os penetras entrando do ônibus para voltarem pra casa. Alguns deles deram entrevistas admitindo a farsa. Outros tentaram despistar, mas não sabiam citar um endereço qualquer do Cruzeiro. Pegou mal. Quanto às propostas, a maioria das pré- conferências não as discutiu. Apenas tomaram conhecimento das do governo e levantaram outras. Uma boa proposta da lei do sistema cultural do DF foi a criação de um cadastro mais abrangente que o CEAC, envolvendo produtores, grupos e espaços culturais. Nós achamos essencial que incluam também as obras culturais. Todo artista ou grupo que tenha uma obra pronta (livro, filme, CD, espetáculo, exposição) poderia cadastrá-la. Assim a cidade poderia ter um catálogo do acervo e o registro de como ele está se desenvolvendo. 

As sete leis da Cultura do DF - publicado na edição nº 0

As sete leis culturais são:
1ª - Constituição Federal (arts. 215, 216 e 220 a 224);
2ª- Lei Orgânica do DF (arts. 246 a 253);
3ª - Lei 111/90, que criou o Conselho de Cultura do DF;
4ª - Lei 158/91, que criou incentivos fiscais e o primeiro fundo de cultura do DF, mas nunca foi posta em prática;
5ª - Lei Complementar 267/99, que revogou a 151 e transformou o primeiro fundo em FAC, iniciando os apoios a projetos em 2000;
6ª - Lei Complementar 782/08, que destina 0,3% da RCL do DF para o FAC, dando uma turbinada necessária nos recursos.

A sétima será elaborada a partir do resultado da III Conferência de Cultura do DF e poderá representar um avanço ou retrocesso, dependendo da compreensão dos delegados sobre o papel que desempenham nesse momento histórico.

As seis leis já existentes e os decretos que as regulamentam estão disponíveis no site: www.culturanaveia.com.br.

Esse site é parte de um projeto do FAC de 2010, realizado por Claudia Almeida, nossa companheira aqui na Cultura de Classe. Ela está realizando oficinas populares para os artistas se cadastrarem no CEAC e fazerem seus projetos para o FAC. As oficinas são gratuitas e as inscrições estão abertas para o módulo “Como elaborar projetos culturais”, mas é somente para artistas de Paranoá, Ceilândia, Recando das Emas, Itapoã e São Sebastião.

História do dia 1º de maio - publicado na edição nº 0

No século XIX, intensificaram-se as lutas por condições dignas de trabalho. O 1º de maio assumiu grande importância nessa luta, especialmente em razão de diversos movimentos ocorridos na Inglaterra, França e Estados Unidos. Emílio Gennari relata essa história em um ótimo texto, do qual publicamos alguns extratos, mas o texto completo se encontra em: www.espacoacademico.com.br/011/11gennari.htm “Em dezembro de 1888, a Federação Americana do Trabalho aprova a proposta de realizar uma nova greve geral no dia 1º de maio de 1890 para estender a jornada de oito horas a todo o território dos Estados Unidos. Esta decisão acaba tendo repercussão no Congresso Socialista que em julho do ano seguinte reúne em Paris 391 delegados de 20 países. Entre suas decisões, o 1º de maio de 1890 é escolhido como o dia de uma grande manifestação internacional para impor aos poderes públicos a redução legal da jornada de trabalho para oito horas diárias.” “A elite procura fazer do 1º de maio um momento que reafirma sua visão da relação entre patrões e trabalhadores. Em 26 de setembro de 1924, um decreto do Presidente da República, Artur Bernardes, transforma esta data em feriado nacional. Ao falar do decreto, a mensagem presidencial enviada ao parlamento no ano seguinte diz: A significação que esta data passou a ter, nos últimos tempos, consagrando-se não mais a protestos subversivos, mas à glorificação do trabalho ordeiro e útil, justifica plenamente o nosso voto.” “Os poderosos criam o feriado de 1º de maio quando ainda não há uma lei que determina a jornada de trabalho de oito horas, motivo das manifestações que deram origem a esta data. Na verdade, a elite brasileira procura se apropriar dela justamente para esvaziá-la do espírito de luta depositado pela classe trabalhadora.” “A rebeldia, a dignidade e a solidariedade são o combustível que alimenta o fogo subterrâneo do qual falava Spies após ouvir a sentença. Os patrões fazem de tudo para apagar as faíscas, mas o fogo faz brotar outras onde eles menos esperam. Veja só esta manchete de primeira página do jornal A Plebe de 1948: Primeiro de Maio é um dia de protesto. Não é a “festa” do trabalho, como afirmam os mistificadores. O trabalho vive escravizado e os escravos não costumam festejar a sua escravidão.” 

Naquela serra de Carlos Araújo - publicado na edição nº 0

Em cima daquela serra
Tem o meu rastro na terra
Nas ramas de melancia
Ali nasceu minha infância
Nutrida na abundância
Das ramas de poesia.

Naquela serra, eu garanto,
Tem mais beleza e encanto
Do que dizem certas loas
E quem vai só de passagem
Perde o melhor da viagem
Pois não vê as coisas boas.

Bem lá em cima, é verdade,
Tem muitos pés de saudade
Crescidos na capoeira
E meu ouvido menino
Guarda o canto genuíno
Do xexéu de bananeira.


Ainda quase bruguelo
Eu escutava o duelo
Entre casacas-de-couro
Era uma peleja dura
Mas escrita em partitura
Com uma clave de ouro.



Nas noites cheias de lua
Não se via lá na rua
O que na serra se via
Pois a lua, bem ligeiro,
Erguia em cada terreiro
Um templo de cantoria.


Lá na serra onde nasci
Não dá pra dizer aqui
Tudo quanto vi por lá
Mas sinto ainda o deleite
De cada dente de leite
Mastigando jatobá.


E a resina de anjico
Só de falar eu já fico
Sentindo gosto no nome
Aquele bem precioso
Era um jeito saboroso
De enganar minha fome.


Grudada em minha retina
Uma imagem cristalina
Revela um tal vaivém
De um bode no chiqueiro
Feito um sultão verdadeiro
Controlando seu harém.


E a meninada exibia
Sua tecnologia
Rudimentar sem segredos
Para sua diversão
Com muita imaginação
Fazia os próprios brinquedos.


E o chicote queimado
Era um brinquedo animado
Aquecendo o coração
- Está frio ou está quente?
A resposta era a semente
De uma nova emoção.


Quem vê a serra distante
Feito um livro na estante
Que não se abre pra ler
É como uma fantasia
É mulher que se assedia
Mas que não se pode ter.


Quem por lá aparecer
Demorar e conhecer
Rapidamente conclui
Que teve um tempo perdido
E chora por não ter sido
O menino que eu fui.

Os sete sonhos do povo de Carlos Augusto Cacá - publicado na edição nº 0

Depois de fazer o mundo
E deixar tudo arrumado,
Deus teve um sono profundo.
Dia sete, descansado,
Inventou sete pecados,
Todos sete capitais.
Mandou pra sete jornais,
Sete Tvs, sete rádios,
Espalhou em sete estádios,
Pra fazer medo aos mortais.

Sete dias da semana,
As sete culpas nos ares.
De terras interioranas,
percorreram sete mares.
Sete ondas cavalares
pelos sete continentes.
Sete quedas de aguardente
Quebraram sete espelhos.
Sete Evas, de joelhos,
Beijavam sete serpentes.

Sete fantasmas da fome
Arrastam sete correntes.
Sete crianças doentes,
Nascidas sem sobrenome,
Há sete dias não comem.
Sete mães cantam lamentos
Todo dia, noite a dentro.
Sete vozes afinadas
Cantando desesperadas
Sete dores de rebentos.

Sete cores do arco-íris
Pintam o sete de novo.
São sete sonhos do povo
Da nossa terra brasilis:
Ter sete filhos felizes,
Todos serem estudantes,
Fazer amigos e amantes,
Ter mais festa e mais justiça,
Produzir pra quem precisa,
Governar os governantes.

Soneto da Mãe Gentil de Leonardo Almeida - publicado na edição nº 0

O meu país navega em minhas veias
onde não há sinal de calmaria
e no meu sangue esse país deságua
e no meu coração, por fim, naufraga

O meu país caminha em minhas veias
com suas vestes, rotas, maltrapilhas
esfomeado, no meu corpo clama
e dos meus olhos salta e se derrama

Esse país que é tão meu, que é minhalma
que se confunde à dor desse meu peito
esse gigante, niño sonolento

me faz vestir o manto brasileiro
tecido em sangue, do melhor que havia,
en el tercer mundo, tropical sangria.

Um fado cego de Donne Pitalurgh - publicado na edição nº 0

Dei pra dedilhar um fado cego
na guitarra portuguesa do meu medo
e pelo Alentejo eu carrego
D'oliva da manhã, o gosto azedo.

O peito enferrujado feito prego.
Heterônimo de dor e azulejo.
Meu amor, eu te amo te renego
na pessoa lusitana do meu beijo.

Quanto mais mar houvera, mais navego
oceano proceloso, céus, rochedo,
buscador que sou de primavera.

Quanto menos El Rey espera, mais eu chego,
noite alta, madrugada, manhã cedo,
na nau catarineta da quimera.

8 de jul. de 2011

Mecanismo das Políticas Públicas

A aplicação das políticas públicas do setor cultura pode ocorrer por meio de diversos mecanismos. Passamos agora a relacionar os mais frequentemente utilizados nas últimas décadas, fazendo as observações sobre sua adequação a cada tipo de política.

O Estado como produtor de eventos culturais
É comum o Estado realizar festivais, mostras ou eventos culturais de aniversários das cidades ou outras datas comemorativas. Nesses casos, mesmo sem interferir na produção das obras culturais, o Estado “produz” o evento cultual. Por isso, muitas vezes, esse tipo de política é criticada como interferência indevida do Estado na “produção cultural”. Então é preciso distinguir “produção de eventos culturais” de “produção de obras culturais”. É admissível que o Estado faça a primeira, respeitados certos limites para não prejudicar a “produção de eventos culturais” da própria sociedade, mas não é adequado que o Estado interfira na “produção de obras culturais”, seja por encomenda ou por sujeição dos corpos de baile ou orquestras sinfônicas aos seus interesses políticos.
Outra coisa a observar é que, mesmo na “produção de eventos culturais”, a seleção dos grupos artísticos pode seguir critérios políticos, o que também caracteriza o “dirigismo cultural”. Para evitar isso, é importante que, em lugar de escolhas monocráticas da autoridade cultural, haja processos seletivos transparentes, com abertura de prazos para inscrições dos interessados e comissões de seleção com participação de representantes da comunidade.
Observe-se ainda que as decisões isoladas de autoridades facilitam outros desvios da função estatal de fomentar a cultura, tais como o apadrinhamento, o personalismo, o clientelismo e até a prática da corrupção. Tudo isso se contrapõe à necessidade da sociedade de ter políticas públicas voltadas para o desenvolvimento do setor. No caso da cultura, a necessidade de apoio ou financiamento de projetos culturais privados que sejam importantes para o fortalecimento da cultura local, regional e nacional.

O apoio à produção cultural comunitária por decisão individual no Executivo
Existem diversas formas de apoio estatal à produção cultural comunitária, seja apoiando ou financiando a produção de obras ou de eventos culturais propostos pela comunidade. Conforme o caso, há mais ou menos transparência e democracia no processo de escolha. Pode haver, por exemplo, processos em que a escolha se dá unicamente pela autoridade dirigente do órgão cultural, alegando poder discricionário para apoiar quem ela quiser. Então, é comum que as escolhas ocorram sem qualquer processo seletivo.
Nesse mecanismo, geralmente, não há transparência. As negociações ocorrem nos gabinetes dos dirigentes, o que favorece a manipulação do administrador em favor de grupos ou obras que queira privilegiar. Assim, facilita não só o “dirigismo cultural”, mas também o personalismo, o clientelismo e até a corrupção. A utilização dessa forma de decisão tende a regredir em função do princípio da impessoalidade da Administração Pública, inserido na Constituição de 1988.

O apoio à produção cultural comunitária por decisão individual no Legislativo
Outro mecanismo de apoio que pode ter critérios de escolha semelhantes ao da decisão individual do executivo é o da aprovação de “emendas parlamentares”. A autoridade parlamentar pratica um certo poder discricionário para incluir uma emenda no orçamento em favor do projeto que ela quiser. Não há processo seletivo. Formalmente, a decisão pode até ser coletiva, se for referendada por comissões parlamentares, mas, na prática, os deputados dividem antecipadamente os valores de emendas individuais que cada um irá propor e depois todos homologam as emendas trazidas por cada um.
Termina sendo um mecanismo de decisão individual do parlamentar. Esse tipo também favorece o clientelismo, porque as negociações ocorrem nos gabinetes parlamentares. Portanto aqui também não há transparência. É uma política que também facilita a manobra dos parlamentares em favor de um ou outro grupo em função de proximidade política, o que é outra forma de praticar o “dirigismo cultural”. Como no caso anterior, facilita o clientelismo, o personalismo, e até a troca de favores e desvio de parte dos recursos para o parlamentar, mas, mesmo assim, tem crescido a sua utilização, mesmo depois de a Constituição de 1988 tratar a impessoalidade como princípio da Administração.

O apoio estatal à produção cultural comunitária por decisão da iniciativa privada
É um mecanismo conhecido como “Leis de Incentivo”, no qual o governo confere poder às empresas privadas para que elas usem dinheiro público no apoio aos projetos culturais que elas quiserem escolher. Essas empresas devem entrar com uma parte de recursos próprios e isso lhes assegura o poder de decisão, quase que sem nenhuma interferência do Estado. A este só cabe fornecer um certificado previamente qualificando o projeto para ir procurar o apoio com base na lei de incentivo. As empresas ficam à vontade para realizarem ou não um processo seletivo e raramente realizam.
Esse é outro mecanismo que favorece o clientelismo, porque as negociações podem ocorrer nos gabinetes dos setores de marketing das empresas privadas. Nos 25 anos de existência das leis de incentivo federais (Lei Sarney, posteriormente substituída pela Lei Rouanet) tem havido inúmeros casos de denúncias de artistas que receberam pedidos de propina ou de declararem valores superiores aos recebidos para aprovação de seus projetos. Essas declarações majoradas terminam fazendo com que a empresa obtenha do Estado um ressarcimento até superior ao que deram ao projeto apoiado. É, na prática, uma forma de saquear os recursos estatais. Essas duas leis de incentivo nunca obrigaram as empresas a estabelecerem processos democráticos de seleção nem a divulgarem seus critérios. Portanto aqui a transparência dependerá da boa vontade das empresas privadas.

O apoio estatal à produção cultural comunitária por fundos de cultura
Esse é o mecanismo em que o Estado constitui um fundo de recursos públicos para apoio ou financiamento dos projetos da comunidade e que as decisões de aplicação, em geral, contam com participação de representantes da comunidade cultural. A legislação obriga a realização de processos seletivos públicos, divulgados com antecedência suficiente para que a comunidade apresente seus projetos detalhados. Para concorrer aos recursos, os projetos devem conter: apresentação, objetivos, justificativas, respectivos orçamentos, cronogramas e equipes envolvidas no trabalho, etc. A divulgação da abertura do período de apresentação de projetos acontece por obrigação legal decorrente do princípio da publicidade. O FAC é um desses fundos.
A seleção dos projetos é feita por comissões que julgam o mérito cultural, a adequação orçamentária, e compatibilidade dos currículos da equipes com a complexidade dos trabalhos a serem desempenhados e com os valores previstos nos pagamentos de pessoal. Como se vê aqui, a escolha dos projetos deve obedecer aos critérios de mérito definidos no edital. Isso é necessário para atender ao princípio da impessoalidade. Além disso, vemos que alguns dos itens que serão julgados (adequação orçamentária e compatibilidade de currículos com os trabalhos) também buscam atender ao princípio da eficiência.
As comissões julgadoras geralmente são compostas por autoridades constituídas e representantes eleitos ou indicados pela comunidade cultural. Em lugar de escolhas individuais da autoridade, temos aqui um tipo de julgamento realizado por colegiados, o que contribui para o atendimento do princípio da moralidade. Mais seguro ainda será se as comissões julgadoras contarem com participação paritária da comunidade, como é no caso do FAC.

Por fim, quanto ao princípio da legalidade, todas as formas de aplicação de recursos públicos devem estar previamente previstas em lei. Então presume-se que seja um princípio presente em todas as aplicações de recursos públicos acima descritas. Mas, como se vê, a forma de aplicação de fundos de cultura é a que melhor se adequa à Constituição porque, dentre as políticas públicas de apoio a projetos da comunidade, esta é a única em que favorece a observância de todos os princípios da Administração Pública e também os direitos previstos no art. 215.